PL 4546/2021 pode impactar a Lei das Águas e comprometer o modelo de gestão dos recursos hídricos no Ceará

O Projeto de Lei (PL 4546/2021), atualmente em tramitação no Congresso Nacional, propõe a criação de uma Política Nacional de Infraestrutura Hídrica. Para avaliar as possíveis consequências desse PL para o Estado, especialmente para o Sistema Estadual de Recursos Hídricos, a Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh) promoveu um debate nesta terça-feira, 17, realizado no auditório da sede da Cogerh, com transmissão online.

O evento contou com a participação do Cientista-Chefe em Recursos Hídricos, Prof.  Francisco de Assis de Souza Filho. O professor explica que um dos principais impactos desse projeto pode ser o aumento do valor da água. “Essa questão do pagamento pelo serviço hídrico também encarece o valor da água para os diferentes usuários. A indústria do abastecimento urbano, a lógica da remuneração desse capital, vai ser investido na operação e na manutenção desse sistema por essas empresas privadas, que vão querer auferir algum lucro para ratear seus acionistas”, conta. 

O pesquisador também revela a possibilidade da criação de um mercado da água em torno da outorga onerosa, cenário que pode acarretar no aumento do número de conflitos na região. “O segundo ponto que tem nessa lei é a outorga onerosa, que é a possibilidade de transferir água de um usuário para o outro. Então isso pode gerar um mercado de água aqui no Brasil, especificamente no Ceará. A gente não tá preparado para um sistema de mercado”, alerta. 

O assessor da presidência da Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), Francisco Teixeira, também expressa preocupação com as mudanças propostas pelo projeto de lei. “É um PL que, se transformado em lei, vai trazer prejuízos para a Política Nacional de Recursos Hídricos, mas também para a nossa Política Estadual de Recursos Hídricos do Ceará. Sobretudo, para a Companhia de Gestão de Recursos Hídricos, já que pode fazer com que os reservatórios federais sejam concedidos à iniciativa privada”, reforça. Para ele, a inclusão de uma perspectiva de mercado sobre a operação e manutenção da infraestrutura hídrica e na alocação negociada de água reduziria o caráter democrático, integrado e descentralizado do processo.

Atualmente baseado na descentralização e na participação de diversos atores ligados à administração dos recursos hídricos, o modelo de gestão estabelecido pela Lei das Águas (Lei nº 9.433/1997) pode se tornar mais centralizado e voltado para soluções de infraestrutura. O projeto de lei pode modificar a distribuição de responsabilidades entre os diferentes níveis de governo, podendo impactar a autonomia dos estados na gestão de seus recursos hídricos. 

Focado em projetos de infraestrutura, a proposta também pode influenciar no planejamento e na execução dessas obras, alterando a forma como os fundos são alocados e criando novos mecanismos de financiamento. Essas mudanças podem ter um impacto direto na forma como as necessidades locais são atendidas e na gestão geral dos recursos hídricos no país.

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